segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Parte V — Miràculum et salvatione — Renascere

“Você não pode modificar o destino, caso se veja como parte isolada do Todo; embora, em realidade, isso nunca exista, seja apenas uma ilusão, pois o universo é alteridade e relação, sempre. Se você participa deste campo vivencial, não existe destino, já que este é uma ilusão: só há ciclos e um Plano Maior, onde tudo é participação, no qual você pode — por uma simples questão de arbítrio — ser ator e coautor — ainda que não saiba..., ou se souber, nunca terá ciência completa de tudo”

Para minha surpresa, quando entrei neste comodo, vi o que jamais poderia prever ou sonhar.
Sentada num sofá art déco de veludo vinho, com a perna esquerda em cima do acento e a direita apoiada no chão, estava a lindíssima professora Lusnua.

Imediatamente, me dei conta que a única coisa que separava todo o seu corpo dos meus olhos, era um robe multicolorido de fina seda, transparente e tão macio e delicado que se moldava, sem maiores esforços, à minha imaginação e curiosidade.

Ela fazia suas unhas. Ao me ver, parou e, por breves segundos, me investigou, com seus maravilhosos olhos verdes.

Sim! De início, fiquei profundamente intimidado, mas rápido me desfiz do desembaraço ou de qualquer culpa. Ambos sabíamos o quão desnecessárias eram as palavras naquele momento.
Estas ocasiões únicas — raríssimas, diga-se de passagem — não são marcadas somente por corpos que se juntam: são almas que, por algum motivo, se reencontram e se reconhecem de imediato para algum propósito — muito além do simples desejo.

A força não vulgar que sustentava e impulsionava nosso encontro e união, se inseria nos domínios do arché magnetismo. Mesmo nos falando apenas com o olhar, tínhamos total certeza disso.
Tal certeza foi tanta que tudo aconteceu em menos de um minuto. Neste infinito lapso de tempo, Lusnua deixou a sua perna esquerda cair para o lado, revelando-me tudo o que antes era somente imaginação e fantasia.

Não sei como aconteceu, porque estranhamente perdi o controle sobre meu corpo e minhas ações e meu grau de consciência era cada vez menor. Quando me dei conta, já estava sendo carinhosamente abraçado pelas pernas e por todo o seu delicado corpo branco. Seus braços e mãos me desnudavam da solidão e do medo me guiaram até sua casa. É como se ela já soubesse de tudo, no entanto ambos não tínhamos a menor noção de nada. Parecíamos crianças adâmicas descobrindo o amor.

Minha consciência tornou-se puramente fotogrâmica. Não me era possível ver e compreender nada além do que rápidos instantâneos — quadros — do meu corpo por entre as pernas de Lusnua que se contorcia e gemia, sem conseguir falar ou gritar.

Quando estava prestes a mergulhar na inconsciência e desmaiar em cima do seu corpo perfumado de prazer...Um cheiro, um odor conhecido foi lentamente me trazendo a consciência de volta. Ele vinha do corpo de Lusnua, e emergia do meio de suas pernas, por onde percebemos um corrimento estranho. Inicialmente, pensamos ser sua menstruação, mas não! O corrimento tinha um tom bordô. Como um bom Filho, imediatamente identifiquei e...não era simplesmente um tom ou uma cor definida: era bordeaux!

Bastou eu pensar isso, para compreender que o corrimento não procedia dela: ele vinha de mim!
Em uma nova investida, uma força ainda mais intensa, contra a qual eu não poderia resistir ou sequer lutar, apossou-se novamente dos meus movimentos, ações e, gradativamente, mergulhou minha consciência num estado de embriaguez...extática.

Agora com mais vigor e força, voltei a penetrar em Lusnua, pois o odor transmutou-se num irresistível e sagrado perfume que me fez desejar ainda mais aquela linda e apaixonante mulher branca e de seios pequenos. Antes que eu pudesse gozar, olhei com intensidade para o seu corpo, a partir do seu vente, e vi que uma corrente, uma coluna de luz subia deste ponto até o topo de sua cabeça. Com os olhos revirados para cima, ela sorria como se fossemos coisa única.

Então eu tive o mais vibrante orgasmo que um ser humano poderia ter — ou mesmo suportar!
Eu gozava golfadas e mais golfadas em Lusnua. O orgasmo não parava, parecia que não teria fim. Gritando de prazer, eu também roguei a Deus que terminasse com aquilo, pois eu não suportaria mais um segundo deste maravilhoso prazer. De nada adiantaram as minhas preces! Eu simplesmente não parava de gozar. A intensidade do meu orgasmo foi tanta, mas tanta que a vagina de Lusnua não comportava tamanha quantidade de sêmen, que começou a escorrer pelas suas pernas.

Notei, então, quase desfalecendo de tanto prazer, que eu não estava gozando sêmen, mas vinho, o mais nobre e excelso Grand Cru que já foi visto no mundo, porém nunca degustado. Não sabia de onde ele vinha, mas estava eclodindo de dentro de mim, como seu eu fosse a reunião de todas as videiras que outrora existiram no mundo.

Cabernet Sauvigno, Merlot, Pinot Noir, Syrah, Chardonnay, Sauvignon Blanc, Riesling Renano, enquanto eu amava Lusnua — sem parar de ejacular este sagrado vinho —, eu podia sentir e diferenciar todos matizes e boques destas e de tantas outras uvas que ali se faziam presente — como um milagre!

Por um ato voluntário e de absoluto desprendimento, me rendi aquele sacrifício último.

Um latejante fluxo de minha vida foi derramado, por mais uma vez, onde jorrei uma quantidade ainda mais absurda de vinho no útero de minha amada. Após isso, não suportando o peso do meu próprio corpo, cai no chão, ainda com um resquício de consciência.

Mesmo debilitado, me dei conta de que este seria o derradeiro momento para sagrar aquela maravilhosa mulher, concedendo-lhe a iniciação tricula. Estatelado no chão, meio nu e meio vestido, meus lábios tocaram o chão encharcado de vinho, que facilmente desceu pela minha garganta. Com a minha mão direita, segurei a sua esquerda, no entanto, pensei: “Como sagrar e transferir o fogo àquela mulher, se não há pão?”

Levantei minha cabeça, e olhei Lusnua na mesma posição em que a encontrei ao entrar no seu quarto, porém totalmente nua e em absoluto êxtase. Seu clitória latejava com um brilho rubro metálico e entre suas sobrancelhas um círculo de azul índigo pulsava intensamente.

“Não consigo! Não há pão!”

Assim como disse, no início desta segunda narrativa, que seria mais adequado deixar o Sanav Rostran falar e narrar os fatos que se seguiriam, chegou o momento de interrompê-lo, pois não há mais forças e vitalidade para sustentar a sua fala. É humanamente impossível fazer isso!

Sim! O vinho era abundante e tão miraculoso quanto em Canaã. Onde estava o pão, meu amor Sanav? Você não se deu conta, mas se fartou do Dele a todo momento — sem saber! Este é o meu corpo e você foi o meu sangue. Não fizemos somente amor: unimo-nos em eucaristia mútua.

Quando você levantou a cabeça, segurando minha perna com sua mão, achando que tinha fracassado, há muito que eu já havia sido — durante aqueles momentos — ungida e consagrada por ti, porque o fogo passou a habitar em mim por sua causa, meu amor.

Um fogo avassalador que me consumia por inteira e uma vivida sensação de estar comungado com algo que transcendia o próprio corpo, me fez parir, ante os nossos olhos, quatro grupos com sete sementes: cevada, lúpulo, trigo e videira, estando todas envoltas e lubrificadas no mais puro e perfeito azeite de oliva.

Estes grupos de quatro Sementes-Mãe, cada uma com sua cor metálica e vibrante, ficaram flutuando no ar, pairando ente mim, estasiada no sofá e Sanav, aniquilado no chão.

Em seguida, como numa divisão celular, aconteceu, em pleno ar, a seguinte expansão matemática:

Os Quatro Grupos de Sementes-Mães

Trigo

Videira

Cevada

Lúpulo

7 sementes

7 sementes

7 sementes

7 sementes

7 x 19 = 133

7 x 19 = 133

7 x 19 = 133

7 x 19 = 133

133 x 4 = 532

133 x 4 = 532

133 x 4 = 532

133 x 4 = 532

532 x 19 = 10.108 sementes
10.108 x 4 = 40.432 sementes

Agora, o mais lindo!

Tal qual vaga-lumes, as 40.432 sementes se mesclaram numa maravilhosa profusão luminescente, até que atingiram uma mistura equilibrada, um conjunto coeso e estável de múltiplas luzes, vibrando harmonicamente com a vida e o destino do porvir.

Logo em seguida, um vento insólito que vinha de todos os cantos, dispersou as sementes-filhas para o céu, em todas as direções da Terra.

Olhei para o chão. Já em seus últimos momentos e olhando firmemente para mim, Sanav desmaiou e caiu com seu rosto em cima da enorme poça de vinho que ele mesmo tinha gerado. Em seguida, teve início um fantástico processo de dissolução. Suas vestes e seu corpo se liquefizeram, até se desintegraram, desaparecendo por completo no vinho.

Em pouco tempo, creio que não mais do que três minutos, algo começou a brilhar em meio aquela inundação vinífera. Um pequenino corpo começou a emergir lentamente dali. Era algo escuro, misturado com o vinho que escorria de sua superfície. Aos poucos, foi tomando forma um pequeno e negro escorpião alado, cujas asas emitiam um som constante e forte.

Ele emergiu do vinho, na minha frente, por entre as pernas e se aproximou do meu rosto, olhando-me fundo nos olhos. Eu senti quem realmente ele era e o que faria a seguir. O pequeno aracnídeo saiu em alta velocidade pela janela, alçando voo rumo a um ato de justiça.

Inicialmente pequeno, a medida que o aracnídeo alado voava e ia mais alto, maior se tornava o seu corpo negro e suas asas multicoloridas. Estupefatos, os moradores do Agorin olhavam aquele corpo tomando proporções impensáveis. Como suas dimensões progrediam em gigantismo, o som e a vibração de suas asas eram ouvidas por todo o Pollatan. Medo e pânico se apoderaram da cidade maldita, que testemunhava um “raro evento mítico” de origem tricula, cobrindo — e já fazendo desaparecer! — o céu da região.

Nada poderia detê-lo! Quanto mais alto voava, maior e mais poderoso se tornava o escorpião negro!

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